Por Thiago Resende para a Folha de São Paulo
O governo deve apresentar uma proposta para que uma empresa privada seja responsável pelos chamados benefícios de risco, como auxílio-doença e acidente, de servidores públicos.
A mudança valeria para os regimes de Previdência do funcionalismo da União, estados e municípios. A gestão caberia a uma empresa seguradora, que receberia parte das contribuições pagas pelos servidores.
Segundo técnicos do governo, a privatização dos chamados benefícios não programados irá atender a uma demanda, principalmente, de municípios pequenos, cujos regimes são menos preparados para riscos, como um acidente em larga escala. Hoje, cada ente pode criar regras distintas para esses auxílios.
No entanto, para a União, que tem cerca de 630 mil servidores ativos no Executivo, a medida não deve ser vantajosa, na avaliação da equipe econômica. No ano passado, o índice de afastamento por motivo médico foi de 1,5%.
Esse é um dos pontos do projeto de Lei de Responsabilidade Previdenciária, que deve ser apresentado nesta terça (26) ao Congresso Nacional.
O projeto visa incentivar que estados e municípios também façam uma reformulação nas regras de aposentadorias e pensões dos servidores e, assim, controlem o aumento dessas despesas, que pressionam as contas públicas. Essa é, portanto, a fase pós-reforma da Previdência.
“Queremos que os entes pensem nas consequências das decisões atuais para as contas públicas”, disse o deputado Silvio Costa Filho (Republicanos-PE), que será o autor da proposta negociada com o governo. O projeto começará a tramitar pela Câmara.
Neste ano, o Ministério da Economia já chegou a preparar um projeto para privatizar a gestão do auxílio-doença, auxílio-acidente e salário-maternidade dos trabalhadores da iniciativa privada, em vez de manter nas mãos do INSS.
A ideia, porém, enfrenta forte resistência no Congresso. Os parlamentares temem que, ao deixar as perícias sob responsabilidade de uma empresa privada, trabalhadores poderão ser prejudicados. Não há ainda previsão para esse investida do governo.
O projeto da Lei de Responsabilidade Previdenciária, contudo, tem como foco aposentadorias e pensões de servidores da União, estados e municípios. O rombo nos regimes do funcionalismo é um dos motivos para a crise fiscal desses entes.
Outra ideia é que, antes de o governante conceder um aumento salarial a servidores, a medida ficará condicionada ao impacto nas contas da Previdência.
Técnicos do governo afirmam que, assim, será criada uma barreira indireta à elevação de salários do funcionalismo, cuja renda já é mais alta que no setor privado.
O aumento da remuneração deve ser condicionado a uma avaliação atuarial —estudo que projeta a necessidade de receitas e despesas para que um regime de Previdência seja sustentável.
Se o governante insistir em elevar os salários, poderá ser obrigado a compensar com regras mais duras para aposentadorias ou alta na taxação para financiar os regimes, explicam integrantes do Ministério da Economia.
Estados e municípios que descumprirem essa norma poderão sofrer punições, como o fim de repasses não obrigatórios por parte da União, das garantias dadas em caso de empréstimos ou impedimento de empréstimos em bancos públicos.
Com o projeto de lei, o governo quer ainda possibilitar que municípios se juntem em consórcios públicos. Assim, a gestão das aposentadorias dos servidores teria um custo menor e seria possível cumprir os requisitos técnicos para dirigentes e criação de diretorias e conselhos deliberativos para decisões sobre o regime.
Em outro artigo, a proposta deve ainda permitir que União, estados e municípios possam transformar ativos financeiros, como dívida ativa, arrecadação de royalties e IR (Imposto de Renda) retido na fonte, em títulos e vender esses papéis no mercado. É a chamada securitização.
O objetivo dessa medida é que os entes possam antecipar receitas futuras.
Estados e municípios que aderirem à reforma da Previdência, em vigor para servidores federais há cerca de duas semanas, terão benefícios, como tratamento diferenciado nos limites de endividamento.
Por exemplo, o valor securitizado não entraria no cálculo da dívida. Assim, o ente teria mais espaço para obter financiamentos com garantia da União ou em bancos públicos.
Outro incentivo dado é que o prazo do CRP (Certificado de Regularidade Previdenciária) seria de dois anos. Esse documento é necessário para que a União transfira recursos não obrigatórios (voluntários) e para os empréstimos.
Quem não aderir à reforma da Previdência terá um prazo para cumprir a nova lei de apenas um ano. Estados e municípios que alterarem as regras de aposentadoria conforme o funcionalismo federal terão prazo adicional de dois anos.
O projeto de lei exige um plano de controle de riscos atuariais e para equacionar rombo do regime de aposentadoria de servidores. Poderão ser estabelecidas alíquotas extras de constituição previdenciária diferentes para ativos, aposentados e pensionistas.
Técnicos do governo dizem que a Lei de Responsabilidade Previdenciária não depende da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que facilita a adesão de estados e municípios à reforma da Previdência. A Câmara resiste à ideia.
Governadores e prefeitos que não acreditam na aprovação dessa PEC já se movimentam para aprovar as próprias reformas nas respectivas Assembleias e Câmaras Municipais. Os critérios de aposentadoria precisam ser compatíveis com o do funcionalismo federal para ter direito aos benefícios.